terça-feira, 27 de maio de 2008

DRAMAS DE GENTE MAL AMADA-II

II-O CASO DO PAI AUSENTE

O Nuno tem dezoito anos e é uma pessoa que sofre de uma solidão profunda. A sua dor radica no facto de não ter conhecer o pai, pois este fugiu para o Brasil com outra mulher, tinha ele cerca de dois anos.

Se o pai tivesse morrido, a mágoa não seria tão profunda, pois tratava-se de uma fatalidade ou um acidente.

Mas o abano tem para o Nuno o sentido de uma rejeição com consequências continuadas. A mãe é uma mulher frustrada no casamento, pois também se sente uma mulher trocada.

Vinga-se da traição do marido dizendo muito mal dele para o filho. Este modo de proceder da mãe gera no Nuno um sentimento de revolta, pois ele gostava de ter uma imagem positiva do pai, a fim de ter algum modelo de identificação.

Na verdade, o ser humano precisa de ter modelos positivos de referência e padrões de identificação que sejam modelos.

Na verdade, um pai bom é um excelente padrão de referência. Há momentos em que o Nuno se sente fortemente impelido para ir á procura do pai. Sente uma vontade enorme de abraças o pai.

Estes desejos são, no fundo, uma tentativa de preencher o vazio que sente e que o faz sofrer.
No seu íntimo, o Nuno vive como se lhe faltasse algo de fundamental.

Devido aos seus conceitos religiosos distorcidos, a mãe do Nuno não foi capaz de lhe comunicar um sentido válido para a vida.

Através de ensinamentos deformados, esta mulher acabou por incutir fortes sentimentos de culpa no seu filho.

Quando a mãe se põe a falar mal do pai do Nuno, este sente-se muito mal. Tem um pouco a sensação de que a mãe, com este procedimento está a destruir algo de si mesmo.

O Nuno sente-se uma pessoa sem apoios sólidos. Na verdade, os filhos amam as mães através dos pais e os pais através das mães.

Para se sentir bem-amado, o filho precisa de sentir que a mãe e o pai se estimam e valorizam.
De facto, o triângulo edipiano composto pelo pai, mãe e filho, é o contexto ideal para a estruturação equilibrada dos filhos.

Os pais que se esforçam por preservar este triângulo estão, de facto, a ser excelentes mediações que os seus filhos se possam estruturar de modo satisfatório e feliz.

Por vezes imagina o pai a repreendê-lo e sente que isto seria muito bom e importante para si.
Para se estruturar bem, a pessoa humana precisa de uma dinâmica relacional onde aconteça o confronto e a reciprocidade.

Isto significa que a pessoa humana, sozinha, não consegue possuir-se e habitar-se de modo satisfatório.

Se a mãe lhe falasse bem do pai, o Nuno podia idealizá-lo, interiorizando a figura de um pai ideal. Mas assim nem isto pode fazer.

Temos de reconhecer que as mães não devem roubar os pais aos filhos, mesmo que se trate de um pai imaginário.

Hoje, o Nuno não tem ideais nem projectos de vida. Vive uma vida sem sabor. Apesar de não lhe faltar nada em termos materiais, o Nuno sente-se uma pessoa insatisfeita e infeliz.

Quem não sente vocação para o dom não devia gerar filhos. Não é de indivíduos humanos que a Humanidade está carenciada, mas de homens e mulheres bem-amados e, portanto, capacitados para gostarem de si e dos outros.

Não basta procriar para se ser verdadeiramente um pai humano. A paternidade humana exige dom e muito amor.

Uma paternidade humana reduzida ao nível da mera dimensão biológica fica ao nível da paternidade do cão e do gato.

Não é difícil compreender como a paternidade verdadeiramente humana exige muitas mortes, as quais são necessárias para gerar vida humana e não apenas biológica.

Como não tem uma experiência paternal, a noção de Deus Pai é um conceito sem conteúdos para o Nuno.

Isto quer dizer que o Nuno não tem experiência nem ideal que dê conteúdo à noção espiritual de Deus Pai.

Podemos dizer que a paternidade humana é uma mediação para a paternidade divina se revelar.

Em Comunhão Convosco
Calmeiro Matias

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